Ansiedade de separação e adaptação escolar: um olhar psicanalítico
- Ligia Estanqueiros
- 4 de fev.
- 2 min de leitura
A partir da minha experiência clínica, observo como o início do ano letivo é um momento que desperta muitas inseguranças e angústias, tanto em crianças e adolescentes quanto em seus familiares. O retorno à escola ou a entrada em um novo ambiente escolar pode mobilizar intensamente aspectos emocionais profundos, muitas vezes ligados às primeiras experiências de separação vividas na infância. O objetivo deste texto é refletir sobre esse processo através de um olhar psicanalítico, acolhendo os sentimentos envolvidos e compreendendo como podemos auxiliar nesse percurso.
Desde muito cedo, a criança vivencia o desafio de se afastar gradualmente daqueles que exercem a função de cuidado, um processo essencial para o desenvolvimento de sua autonomia. Esse processo, que faz parte do desenvolvimento emocional, que pode ser vivenciado com maior ou menor intensidade, dependendo das experiências anteriores, da qualidade do vínculo com os cuidadores e das condições psíquicas de cada indivíduo. Quando uma criança se depara com a ida para a escola, muitas vezes revive inconscientemente angústias ligadas à perda e ao medo do abandono. Algumas expressam essa angústia de maneira mais visível, através do choro, da recusa em frequentar a escola ou de queixas somáticas, enquanto outras podem internalizar o sofrimento, tornando-se mais introspectivas e inibidas.
Para os adolescentes, a questão da separação assume um significado diferente. Se, na infância, a saída de casa para a escola representava um primeiro passo rumo à autonomia, na adolescência, a escola se torna um espaço de experimentação de identidade e pertencimento. O medo do julgamento dos pares, a busca por aceitação e a construção de uma nova identidade social podem gerar angústia e ansiedade, expressas de diversas formas, como irritabilidade, retraimento ou dificuldades no aprendizado.
A adaptação escolar, portanto, não é um evento pontual, mas um processo subjetivo que mobiliza a história emocional de cada indivíduo. É fundamental que pais, educadores e profissionais da saúde mental possam oferecer um espaço de escuta empática, permitindo que a criança ou adolescente nomeie e elabore seus sentimentos. Muitas vezes, ao validar a angústia e o medo, ajudamos a transformá-los em experiências elaboráveis, reduzindo a ansiedade e facilitando a adaptação.
Para que esse momento seja vivido com mais tranquilidade, é essencial que a criança se sinta segura ao se despedir dos pais, compreendendo que essa separação é temporária e que seu retorno é garantido. A construção de laços afetivos dentro da escola também é fundamental, permitindo que o novo ambiente se torne mais familiar e acolhedor. Quando a ansiedade se torna muito intensa e passa a interferir na rotina da criança, buscar um acompanhamento psicológico pode ser um suporte valioso para ajudá-la a elaborar esses sentimentos e atravessar essa fase com mais segurança.
A psicanálise nos ensina que cada experiência de separação carrega em si não apenas um movimento de perda, mas também a possibilidade de crescimento. Ao acompanhar crianças e adolescentes nesse percurso, não buscamos eliminar completamente a angústia, mas oferecer condições para que ela seja vivida e elaborada de maneira que fortaleça sua capacidade de lidar com os desafios emocionais ao longo da vida. Assim, cada início de ano letivo pode se tornar não apenas um momento de tensão, mas também uma oportunidade de amadurecimento e desenvolvimento psíquico.
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