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Janeiro Branco e a Ilusão da Virada: Reflexões Psicanalíticas Sobre o Cuidado com a Saúde Mental

  • Foto do escritor: Ligia Estanqueiros
    Ligia Estanqueiros
  • 4 de fev.
  • 2 min de leitura

Janeiro Branco e a Ilusão do Recomeço: Uma Reflexão Psicanalítica


A virada do ano costuma ser acompanhada pela sensação de um recomeço. O calendário se reinicia, e com ele, a promessa de novas possibilidades. O Janeiro Branco, campanha voltada à conscientização sobre a saúde mental, surge nesse contexto, convocando à reflexão. Mas o que significa, afinal, cuidar da saúde mental? E por que tantos projetos de mudança parecem fadados a se repetir sem grandes efeitos?

A psicanálise nos ensina que a noção de “começo” é sempre relativa. O sujeito não se refaz a cada janeiro, tampouco se reinventa pelo simples desejo de mudança. Ele carrega sua história, seus impasses e os determinantes inconscientes que orientam suas escolhas. Assim, a ideia de um recomeço absoluto esbarra na estrutura psíquica que o antecede. O novo ano pode trazer resoluções inéditas, mas aquilo que resiste à mudança — os sintomas, as repetições, as defesas — segue operando em silêncio.

Essa é uma das razões pelas quais tantas tentativas de transformação se esgotam rapidamente. Há um desencontro entre a expectativa consciente e as forças psíquicas que operam sem que delas se tenha pleno saber. O sujeito quer mudar, mas sem enfrentar a angústia do desconhecido, sem lidar com as perdas que qualquer mudança real implica. Assim, muitas resoluções de ano novo acabam por reforçar um ciclo familiar: promessas efêmeras, seguidas de frustração e culpa, que por sua vez sustentam novas promessas.

O cuidado com a saúde mental, nesse sentido, não pode ser reduzido à adoção de práticas supostamente benéficas ou à eliminação do sofrimento a qualquer custo. Não se trata de “pensar positivo”, nem de buscar uma felicidade idealizada, mas de sustentar um espaço onde as questões mais fundamentais possam emergir. A psicanálise não se propõe a oferecer soluções prontas ou diretrizes de bem-estar, mas a possibilitar que o sujeito construa um saber sobre si e encontre saídas próprias para aquilo que o faz sofrer.

Dessa forma, mais do que um mês de conscientização, o Janeiro Branco pode ser uma oportunidade para interrogar o próprio mal-estar. O que se repete? O que insiste, apesar dos esforços de mudança? Que sentidos podem ser atribuídos ao sintoma? São perguntas que não se respondem rapidamente, mas que exigem tempo e trabalho psíquico. Em um mundo que busca atalhos para o sofrimento, a aposta da psicanálise segue sendo outra: sustentar a pergunta, permitir o tempo da elaboração e reconhecer que toda transformação genuína implica atravessar o desconhecido.

 
 
 

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